sábado, 1 de outubro de 2011

Homenagens em Nomes de Animais

Arte de Weberson Santiago



O critério que usamos para dar nomes aos nossos animais de estimação é muito interessante. Gostamos de mostrar nossos gostos no batismo de nossos bichinhos. Imagino que se trata de uma tentativa de conviver com nossos ídolos ou uma mania de personalizar nossa vida e exibir nossas predileções.

Meu pai, por exemplo, é saxofonista e tem uma coleção com centenas de discos de vinil, com clássicos do jazz e blues. Quando teve um casal de cães da raça Boxer deu o nome de Dexter Gordon e Billie Holiday. Nas duas crias do Dexter e da Billie, os nomes dos dezesseis cachorrinhos foram escolhidos das personalidades deste gênero musical, todos com o pedigree registrando as influências artísticas da cultura afroamericana.

Não acredito na justificativa da nomeação como uma forma de homenagem. Um artista qualquer não deve se sentir honrado em ter seu nome em um cachorro, gato, papagaio, periquito ou qualquer outro animal. Pense no clássico nome da música clássica. Se o compositor e pianista soubesse que seu nome é usado no batismo dos cães, iria ficar constrangido ao imaginar a cena:

― Beethoven, de novo você fez cocô dentro de casa? Não pode! Menino feio!

Estou criticando a mania, mas o verdadeiro motivo para isso foi a confusão em que me meti ao comprar um casal de periquitos. Escolhi a melhor gaiola do pet shop: pé direito alto, balanço no piso superior, banheira no piso inferior, lugar para três tipos de ração.

Escolhi a dedo os periquitos no próprio criadouro, numa chácara onde a terra é fértil e os animais são bem criados e cuidados. Na hora de escolher os nomes, resolvi homenagear o teórico que mais admiro na psicologia: B F Skinner. Sigo sua teoria para fazer as intervenções em todas as minhas atividades profissionais. Acredito na sua teoria favorável ao reforçamento positivo e a diminuição de técnicas coercitivas, devido aos subprodutos emocionais provocados pela punição. Pesquisei sua biografia e descobri que sua esposa tinha o nome de Yvonne Blue. Era perfeito, já que a fêmea era azul.

Assoviava para a dupla todos os dias de manhã, trocava a água, soprava as cascas e completava a ração. Gosto da arruaça que eles fazem pela manhã, acordam com disposição e alegram a casa. Tudo ia indo muito bem até que um dia, quando acordei e fui ao encontro da gaiola, encontrei Skinner morto.

Não entendi o motivo, não fazia sentido. Achei estranho que a sua asa estava toda machucada, mas pensei que a causa da morte era natural e que talvez Yvonne tenha tentado acordá-lo depois que ele caiu no fundo da gaiola. Notei que ela foi ficando desanimada com a solidão e com a Natália e a Anelise fomos comprar uma nova companhia para ela. Comprei um macho, que batizei de Skinner II, e ficamos encantados por uma fêmea albina, branquinha. Não resistimos e a trouxemos também. Demos o nome de Julie, o nome real da filha de Skinner e Yvonne Blue.

Notamos uma hostilidade de Yvonne para com Julie, que vivia separada dos dois na ampla gaiola. Passados alguns meses encontrei Julie morta com as mesmas marcas na asa. Encafifado com mais uma morte, preferi acreditar que o animal albino era mais frágil e que ela havia morrido por isso.

Acontece que há alguns dias encontrei Skinner II morto no fundo da gaiola. O mesmo machucado na asa e uma mancha de sangue no bico de Yvonne me levaram à conclusão que tanto eu quis me esquivar. Eu que dei o nome do psicólogo que era contra a punição, estava criando uma periquita assassina e, além disso, colocando presas fáceis à sua disposição.

Depois desta descoberta, Yvonne conquistou para si todo o espaço da gaiola. É difícil aceitar que o animal que criamos com cuidado e carinho pode não ter uma boa índole. Percebi que um animal de estimação, por mais que eu queira atribuir características humanas, é apenas um animal.

Percebi também que a justificativa para o nome do bicho de estimação pode não ser a qualidade do homenageado, mas o seu outro lado. Não é a toa que a cachorra Xuxa tem latido ardido e que o cão Michael Jackson pula na perna da visita do sexo masculino e faz movimentos obscenos. Não recomendo homenagens a Amy Winehouse, Curt Cobain, Jimi Hendrix e Janis Joplin. Se arriscar, pode perder o seu animalzinho mais cedo do que gostaria.

UM CAFÉ E A CONTA!
| O sentimento de um animal não é diferente do sentimento de um humano. Ambos são produto de um ambiente.


Publicado no Jornal Democratacoluna Crônicas de Padaria

Publicado na capa do Caderno Cultura, 01/10/2011, Edição Nº 1167.


Nenhum comentário: