sábado, 24 de maio de 2014

As Dificuldades de Crescer

Arte de Weberson Santiago



Crescer dói. Não só porque o corpo se estica desde o nascimento até a juventude. Dói porque crescer é ter que aprender continuamente, sem trégua. É receber uma dose maior de responsabilidades a cada ano de vida. É ter de provar seu bom desempenho para a sua família e para a instituição de ensino que escolheram para você e mais tarde, se te derem a liberdade, para a que você escolheu. É ter que provar a si mesmo que você da conta de tudo isso.
Durante as transições, o medo toma conta e a insegurança aumenta. É quando precisamos de alguém que diga: “vá em frente, eu acredito na sua capacidade”.
A Anelise foi para a 1ª série neste ano. Na primeira semana de aula veio colado em seu caderno de recados um calendário de provas. Mudou o formado da apostila de lição de casa, com mais conteúdo e com tarefas um pouco mais complexas. Agora ela entra no portão grande, junto com todos os alunos do ensino fundamental. Pequenas, mas significativas mudanças para uma criança.
Com apenas 6 anos já será avaliada. A responsabilidade pesou. Na segunda-feira da segunda semana de aula chegou em casa contando que não tinha conseguido anotar duas palavras porque tinha ficado conversando com dois coleguinhas.
Poderíamos metralha-la com frases como: “eu já falei que você precisa aprender a se concentrar”, “sua escola é muito cara para você não fazer as coisas que a professora manda”, “se você não fizer a sua parte ficará de castigo”, “ai de você se sua professora reclamar que você fica conversando durante a aula na primeira reunião”.
Recolhi as acusações e ameaças ao lembrar como detestava ouvi-las na minha infância e adolescência.
A Natália e eu tivemos uma conversa com ela, mas em outro sentido: “Anelise, a 1ª série é mais difícil do que os outros anos. Você ainda está se acostumando com essa diferença. Não tem problema que você não anotou as duas palavras hoje. Você só precisa aprender a se concentrar no que a professora está pedindo e terminar a tarefa que ela passou. Deixe pra conversar com seus amigos depois que terminar ou no intervalo do recreio. Uma coisa que pode te ajudar é dormir um pouco a tarde, pois se você fica muito cansada no outro dia, o cansaço atrapalha a prestar atenção. Ainda tem muito tempo pela frente, você vai aprender muito neste ano. Só precisa fazer a sua parte.”
Percebi que ela ficou mais tranquila após a conversa. Para nós, a Ane ter contado o que aconteceu foi muito bom, um sinal de que ela confia em nós. Mais do que isso, ela estava pedindo ajuda. Foi como se ela dissesse: “não estou dando conta do começo da 1ª série e estou preocupada se vou conseguir dar conta até o final”.
No dia seguinte, fui leva-la pra escola. Antes que descêssemos do carro, eu disse:
— Hoje vai ser melhor que ontem, Ane!
— Tomara, Augusto, tomara! – respondeu, com os olhos cheios de esperança, mas ainda um pouco insegura.
Como nós confiamos nela, ela também confiou no que dissemos e se encarregou de dormir um pouco a tarde em todos os dias que se seguiram, sem qualquer cobrança de nossa parte.
Nas semanas seguintes, uma conversa ao final de cada dia nos mostrou que ela estava dando conta do começo. Ela ficou mais confiante e segura.
Novas dificuldades virão. Logo chegarão as provas e precisaremos ajuda-la com a novidade. Que bom! Essas dificuldades mostram que a Anelise está crescendo.
UM CAFÉ E A CONTA!
| A função dos pais é ajudar a enfrentar as dificuldades do caminho, não apenas tomar para si o mérito das vitórias dos filhos.

Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, caderno Dois, p. 4, 24/05/2014, Edição Nº 1305.

sábado, 10 de maio de 2014

Orgulho de Mãe

Arte de Weberson Santiago



Se você tem dúvida do quanto uma mãe se orgulha dos seus filhos, observe apenas um detalhe: aquela correntinha com os pingentes que representam os filhos que ela tem.
O pingente que mostra a maternidade é como uma medalha no pescoço de uma mãe. Ela o coloca porque gosta de exibir o quanto ela é mãe. Não é pelo número de pingentes, é pelo amor que ela tem por cada um dos que estão ali representados.
Ela deu a luz, está amamentando e arrumou um tempo para comprar o pingente.
Carregando a criança no ventre durante nove meses, ela se encarregou de criar um mundo especial entre quatro paredes para que ele ou ela saia do ventre e tenha um quarto perfeito.
Acolchoou as superfícies duras, impermeabilizou tudo para evitar que a criança não venha a se sujar ou não fique úmida. Cobriu de pano tudo o que era áspero, impediu que qualquer coisa fria pudesse dar calafrios no seu rebento.
Pintou tudo de cor clara para ficar agradável, pendurou a cortina para a luz não ofuscar sua vista ou atrapalhar seu sono diurno. Envolveu o berço de véu para inseto nenhum chegar perto. Quer que o filho fique tão seguro no mundo quanto está na sua barriga.
Quando nasce, ela mata a curiosidade de ver como o filho é. Ainda assim, ela não sabe a cor do olho, não tem ideia de como será o cabelo quando crescer, só sabe se é menino ou menina, mas já se orgulha do filho que tem e acha que ele ou ela é o mais bonito do mundo.
Enquanto a mãe carrega o pingente como uma medalha em seu pescoço, assim que o filho nasce o pai se encarrega de comprar uma roupa do seu time para ver se consegue convencê-lo a seguir sua paixão.
A mãe lhe considera um motivo de orgulho e carrega seu pingente perto do coração para ver se aguenta a saudade durante o dia. O pai impõe o escudo do seu time no peito do filho para que ele o represente enquanto estiver longe.
Nós pais parcelamos todo o nosso amor em algumas condições, condições estas que vamos anunciando assim que a criança é capaz de entender.
Amo o meu filho, mas amarei mais se ele torcer pelo mesmo time que eu.
Amo o meu filho, mas amarei mais se ele seguir a minha profissão e cursar a mesma universidade que eu.
Amo o meu filho, mas amarei mais se ele gostar do mesmo tipo de música do que eu.
Se o amor materno existe antes do filho ser, o amor paterno depende do que o filho será.
É fácil amar o igual, difícil é amar o que constatamos ser diferente de nós ou das nossas expectativas.
O homem é tão egoísta que, quando o filho acerta, puxou pra ele. Quando o filho erra, puxou pra mãe. Quando o filho erra, ele literalmente é um filho da mãe.
Quando um filho erra, o pai se afasta. Quando um filho erra, a mãe dá o colo.
Feliz do filho que tem uma mãe e um pai que deixam as suas vontades de lado, que conseguem abrir mão de um individualismo orgulhoso. Olhar com a bondade do orgulho, sem condições ou restrições, é realmente estar ao lado do filho durante o seu desenvolvimento. Os filhos precisam do nosso orgulho e da nossa aceitação para crescer.
Quando o assunto é orgulho, os pais precisam aprender com as mães.

UM CAFÉ E A CONTA!
| Mãe é mãe quando o seu amor é incondicional.

Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 10/05/2014, Edição Nº 1303.