sábado, 22 de outubro de 2011

Baldinho Cheio de Conchas

Arte de Weberson Santiago



Quem se lembra da primeira vez que esteve na praia?

Dependendo da sua idade na época, pode ser que você se recorde da primeira vez que viu o mar. Aquela piscina em que os olhos não alcançam a beirada do outro lado. A poça tão grande que não sossega na borda e fica fazendo onda.

Eu não me lembro da minha primeira ida, mas fico na dúvida sobre quem curte mais. Se quem apresenta ou quem conhece o mar pela primeira vez. Nessa situação estávamos a Anelise e eu. Ela nunca tinha visto o mar. Eu apresentava a praia.

Afora toda a expectativa criada em cima da viagem, do baldinho na mala, das explicações do que seria o mar e todos os pedidos de conchinhas dos familiares, o destino foi decidido pela importância do lugar na minha vida.

Santos não é o sonho de cidade de praia deserta e inexplorada, nem tem praia com areia branquinha ou mar esverdeado. Acontece que foi em Santos que eu conheci o mar, e que eu frequentei a praia durante todos os anos da minha vida.

A cidade tem seu charme. O maior jardim de praia do mundo (oito quilometros por toda a orla impecavelmente cuidados), um aquário cheio de animais marítimos, passeio de bondinho pelo centro antigo, o Museu do Café (um prédio suntuoso onde funcionava a Bolsa do Café), o Mirante de Nossa Senhora de Mont Serrat (prédio que abrigou um famoso cassino com uma vista em 360° da cidade, acessível apenas por um vagão que sobe 242 metros de morro em um trilho), um Orquidário e uma infinidade de programas a se descobrir.

Eu descobri a satisfação de percorrer com a pequena os caminhos que percorreram comigo na minha infância. Existe uma sensação prazeirosa em repetir o que vivemos, ocupando lugares diferentes, novos lugares dentro de uma família. Visitamos a estátua de leão que fica no jardim, onde meu pai tem uma foto tirada pelo meu avô, eu tenho uma foto tirada pelo meu pai e agora, a Anelise também tem.

Muita coisa mudou da infância do meu pai até a da Anelise. Quando pediram que ela levasse conchinhas para os familiares fiquei apreensivo. E se não houvessem mais conchas na praia?

Para nossa alegria elas ainda estão lá. Mas se na minha infância se espalhavam com abundância pela areia da praia, atualmente juntar conchinhas é um trabalho de garimpo. É preciso separar as tampinhas de garrafa pet, os pedaços de plástico e muitos outros lixos. Estão raras, é preciso procurar um tanto até achar. O importante é que elas ainda aparecem na areia.

Férias são um abandono temporário do cotidiano. Quando a gente sai do interior e desce para a praia, quer experimentar a maresia para encher os pulmões de fôlego. Recolhemos as conchas para levar um pouco da calmaria do barulho do mar quando voltar pra casa, na tentativa de carregar no baldinho a esperança e a ingenuidade da infância.

Enfrentamos as ondas para não esquecer que a vida tem movimentos como o das correntes do mar. Construímos castelos de areia para que a subida da maré desfaça tudo em sinal de despretensão. Quando a gente sobe a serra, carrega uma mala de roupas sujas de areia da praia e a alma lavada para recomeçar a rotina.

 UM CAFÉ E A CONTA!
| A vida é a oportunidade de sempre fazer as mesmas coisas, só que de uma forma diferente, unica.


Publicado no Jornal Democratacoluna Crônicas de Padaria

Publicado no Caderno Cultura, p. 3, 22/10/2011, Edição Nº 1170.

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