sábado, 23 de junho de 2012

Perder Um Amor é Viver, Perder o Amar é Morrer

Arte de Weberson Santiago




O amor anda esquecido. Parece ter sido deixado de lado. Não vejo as pessoas acordando inspiradas, sorrindo para o dia. Não vejo o amor no bom dia, no boa tarde ou no boa noite.

O amor está à mingua. Não encontra quem abrace a sua causa. Faltam compositores que  defendam o amor em suas letras ou que reclamem a ausência dele por uma mulher que se foi.

O amor está mais vazio que barriga de morador de rua. É usado para descrever qualquer coisa. Os adolescentes exauriram a palavra de significado. Chamam os amigos de amor quando atendem o celular. Tudo aquilo que gostam, dizem que amam. Provocaram o esgotamento do sentimento ao encarar a falta de vocabulário para viver um mundo cheio de estímulos e sensações.

A única coisa que ele ainda não virou é mercadoria. Amor não se vende e não se compra. O amor é escambo. E só pode ser trocado por amor.

A falta de amor tem lá suas consequências. Vivemos a soberania da estupidez, o esbandalhar da agressividade sob qualquer pretexto. Não há lugar para o amor nas instituições. Sou ofensivo porque fui insultado por outra pessoa que trabalha comigo. Ajo de forma hostil por causa de um sistema de computador que não me dá opções.

Ao explorar as razões da mesquinharia de amor, acredito que faltou alguém pra ensinar a usar. Não existe escassez de amor. Ele é um recurso natural sem possibilidade de desaparecimento. Está aí, disponível para qualquer um. Faltam pessoas para retirar o amor da sarjeta, oferecer um  banho, vesti-lo de roupa limpa para que ele possa circular novamente aqui e acolá cheirando a amaciante.

O amor é mais urgente do que ambulância com passageiro. Tem pressa. Uma pressa que precisa ser dividida com quem está no meio caminho. Atrapalha o cotidiano com a persistência de um chiado de rádio na estação preferida. Exige ser entregue quando visualiza um encontro. O amor é uma das poucas coisas que, quando ignorada, expande.

O amor foi traído, trocado pelo sexo. Empurrado para segundo plano, atrás de qualquer possibilidade de sedução. Pra que conservar o amor, lutar por ele, ser fiel a ele se posso ficar seduzindo uma pessoa diferente a cada sexta e sábado à noite? É um vício pelas emoções, que produz uma aparência de liberdade na saída para dissimular a solidão do dia seguinte. Eu fui partidário do caso fortuito, já quis viver de experimentar. Até aprender, depois de muitos dissabores, que existe prazer em se conter. É possível ser feliz na exclusividade. O amor surge para ser preservado, mas deve ser protegido a dois. O amor é meu pão. É o amor que me alimenta.

Amar não é ficar parado no ponto de ônibus, esperando o carro mais vazio, mais bonito e que faz o percurso mais rápido para o destino da ilusão. Muito menos ficar dando uma voltinha em cada ônibus pra ver qual gosta mais, sem atentar ao destino do trajeto. Amar é saber que entre a garagem da viação e o fim da linha existe um congestionamento de corações, mas que nem toda parada é conveniente.  Amar é se encontrar na pista para se tornar ônibus fretado.

É preciso remover as cortinas das janelas através das quais vemos o mundo e retirar a poeira dos vidros quadrados por onde enxergamos os outros. E vislumbrar que o seu amor não é o que você guardou somente para você, mas todo amor que você deu. Perder um amor é viver, perder a capacidade de amar é morrer.

 UM CAFÉ E A CONTA!
| Que tal copiar essas vinte e cinco palavras amor que aparecem neste texto e colar na sua vida?


Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, Caderno Dois, p. 5, 23/06/2012, Edição Nº 1205. 

terça-feira, 12 de junho de 2012

Dia dos Namorados


Foto do Arquivo Pessoal

SOAR DOS OLHOS

O olhar que me tirou o chão.
O olhar que me fez enxergar um caminho.
O sorriso escondido nos cantos amáveis onde espocam meus beijos.

Quando tudo acalma e nossos olhares se encontram é um brinde.
Os olhares ultrapassam os olhos, entram pelo mundo redondo dos sentimentos,
e dele ressoam emoções de quem conhece por dentro.
O soar dos olhos.
Depois do brinde, duas gotas escorrem até o queixo das taças.
A emoção no ar que foi concentrada numa lágrima.
O suar dos olhos.

Que nos dias especiais possamos brindar com os olhos,
e ver a alegria espumante em cócegas de amor pelos lábios adentro.

E que qualquer amanhecer seja especial.
Quando nos esbarrarmos pela casa,
Que não deixemos de ganhar tempo do dia em nossos abraços.

Que o bom dia seja o seu encontro com o meu peito,
E que o boa noite seja o meu repouso no seu colo.

Assim todos os dias vão passar.
Se hoje somos noiva e noivo, sempre teremos sido namorados.

Percorrendo o caminho desenhado pelos nossos olhares,
Um dia eu serei marido, e você sempre terá sido a minha mulher.

sábado, 9 de junho de 2012

Tal Pai, Tal Líder

Arte de Weberson Santiago



Quando um homem se torna pai, seus companheiros de trabalho é que ganham com o nascimento do filho.

Acompanhei a gestação do meu parceiro de trabalho João e outro dia quis confirmar, com a esposa dele, se ele tinha mudado depois da paternidade. Percebi que o João tinha ficado mais paciencioso com a montanha russa da rotina de uma empresa, inclusive nos dias em que a noite de sono haviam sido mais fatiadas do que um pão de forma para cuidar da pequena Mariana.

Quando ela respondeu que sim, a Natália me perguntou se eu havia mudado no trabalho depois da entrada da Anelise na minha vida.

A verdade é que minha vida toda mudou depois que ela chegou, mas a mudança mais significativa foi mesmo no trabalho.

Não é possível negar a ida ao banheiro para a Anelise, independente de onde eu estiver. É preciso arrumar uma latrina a qualquer custo, e deixar de lado o que eu estava fazendo. Não se pode pedir para ignorar a sede quando uma criança pede água, mesmo que tenha acabado de me acomodar depois de um longo dia. A Anelise me obrigou a sair da posição de considerar somente as minhas necessidades e me ensinou a ser mais sensível com as necessidades dos outros. Ganhou quem precisa de mim no trabalho, que me encontra mais disposto para acolher os pedidos e entender os motivos. Hoje sei reconhecer suas precisões mais básicas.

Me encanto com os passos de independência da Ane, quando ela aprende a fazer alguma coisa sozinha, como amarrar o tênis, por exemplo. Só que até ela aprender, precisei repetir as instruções incansáveis vezes e ir estimulando cada passo. Com isso, percebi que alguns princípios que eu defendo profissionalmente devem ser repetidos com frequência para que ninguém esqueça. Assim, notei que ser coerente no que eu falo e no que eu faço é uma forma de dar segurança e incentivo para que trabalha ao meu lado.

As lições de casa da Ane são verdadeiros desafios. Para ela, é um exercício de concentração. Para mim, um exercício de paciência. Depois de ler as instruções e ajuda-la a começar o exercício deixado pela professora, de tempos em tempos ela pede aprovação. “Está ficando bom?”. “Tá bonito?”. A Anelise me fez aprender a gostar de acompanhar o desenvolvimento de quem trabalha comigo. Fez com que eu ajudasse meus parceiros a colocar um foco nas tarefas essenciais, sem esquecer do objetivo final, que é o crescimento.

Para mim, existe uma relação entre como a pessoa lida com seu filho e como ela se dirige e administra as pessoas que trabalham com ela. Um pai que acompanha seu filho, é capaz de fazer os funcionários que estão a sua volta se desenvolverem. Já um pai ausente terá dificuldade de se aproximar de um companheiro de trabalho, o que fará de vez em quando somente para cobrar os motivos de suas insatisfações. Um pai que economiza elogios ao seu rebento não saberá estimular seus colegas de serviço. Se não é um bom pai, não há de ser um bom líder.

Não devemos compensar nossas relações familiares nas nossos relacionamentos profissionais. Contudo, não podemos ignorar que o modelo que somos dentro de casa é o mesmo modelo que levamos para fora dela, inclusive, para dentro do trabalho.

 UM CAFÉ E A CONTA!
| Dizem que grandes líderes são responsáveis, tem posicionamento adequado e autocontrole, são pacientes e compreensivos, sabem delegar, são comprometidos, honestos e autênticos. Só é tudo isso quem tem a coragem de buscar o autoconhecimento.


Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, Caderno Dois, p. 5, 09/06/2012, Edição Nº 1203.