terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

A vida continua depois do carnaval

Quarta feira de cinzas, 14 horas, dia chuvoso de fevereiro. Hora marcada para a reunião dos integrantes do “No comando do seu Peso”, um grupo que se encontra com o objetivo de incentivar a perda de peso. Cristina é a presidente da reunião, comanda o grupo, leva materiais para discussão e acompanha os resultados da balança, algo bem discreto medido na frente de todo os demais presentes. Mas o que importa a tal privacidade, se Cristina conseguiu “eliminar”, como ela própria diz, 45 quilos sem cirurgia. Cada membro novo que chega às reuniões, ela saca sua foto de gorda e mostra. Sim, aquela foto que durante muito tempo ela tinha horror só de pensar, mas que hoje usa como medalha pendurada no pescoço. O programa americano adaptado no Brasil diz que o líder deve ser um modelo de comportamento.

Depois de mais de uma hora de palestra temática para aprender a diferenciar a “fome física” da “fome compulsiva” que, segundo Cristina “é esta a chave do sucesso”, abre-se espaço para quem quiser falar. Este momento que precede a pesagem mais parece o confessionário das farras alimentares, com direito a previsão do número a ser dado pela balança.

Tereza, 43 anos, casada, 2 filhos que moram em outra cidade, 112 Kg, pede a palavra: “Fui assistir ao desfile das escolas de samba da cidade, sempre gostei de carnaval, mas meu marido como sempre não quis me acompanhar. Os meninos foram viajar com os amigos, então chamei e Keilla, minha vizinha, e fomos pro sambódromo. Como na semana passada aprendemos a nos preparar para quando saímos da rotina alimentar, peguei uma sacola térmica e coloquei os lanches e refeições do jeito que estava na dieta. Aí, tivemos que chegar cedo pra pegar um bom lugar, esperar na fila no meio de muita gente e quando olhei para o lado, ‘cadê a sacola de comida?’. Algum esfomeado ficou de olho e pegou quando me distraí. Aí, sabe como é, né? Aquela vaca da Kelly, magra de ruindade, ficou do meu lado comendo tudo o que vendia. Era churros, pastel, pipoca, amendoim... Eu que fiquei lá mais de 12 horas, como ia poder ficar sem comer? Mas eu tentei controlar a quantidade...”.

Marcos, 52 anos, solteiro, 169 quilos, interrompe dizendo: “É por isso que eu não gosto de Carnaval, uma bagunça, aquele povo bêbado, aquela pouca vergonha. Não vou a um lugar desses nem me pagando. Fiquei o feriado todo em casa, até assisti alguma coisa pela televisão, até porque só passa isso... Na segunda, eram três horas da manhã, aquele desfile sem fim, a narração sem graça da TV, começou a me dar uma fome... Não compro mais doces, pra não ter recaídas nessas horas. Como não tinha nada de sustância, me deu vontade de comer caqui, porque eu tenho um pé em casa. Fui lá no fundo e matei minha vontade: comi três dúzias de caqui”.

Em meio às risadas incontroláveis e patéticas Maria, 37 anos, deprimida e solitária com seus 143 quilos: “Eu não vejo graça nessa história do caqui, embora ache que vocês dois até deveriam comemorar. Um não queria sair e ficou em casa. A outra não deixou de fazer o que queria. Meu carnaval foi mais trágico que isso, essa data completa 12 anos...”, “que o seu namorado te largou, abandonou sem muitas explicações e levou tudo o que tinha, não é, Maria?”, antecipa Marcos. “Sei que vocês já conhecem a história, mas eu nunca me senti tão sozinha. Não sei onde achei forças para ir até o salão de festa do condomínio, onde todo ano fazem uma matinê. Bem que tentei paquerar por lá, mas o único homem desimpedido era o Seu Joaquim, aposentado e viúvo de 78 anos. Resumindo, já que vocês sempre ficam enfadados com minhas histórias, esse meu carnaval teve confete e serpentina, enchi a cara de chopp na festa do condomínio e terminei a noite comendo chocolates coloridos no sofá da sala, sozinha.”

“Que tal vermos como cada um está em relação a sua meta, pessoal?”, diz Cristina.






2 comentários:

Rosa Maria disse...

Muito boa......!!!
Tanto sair quanto ficar em casa tem suas alegrias e tristezas.....
O importante é sentir-se bem.....ai sim se aproveita.
Abraços.

Augusto Amato Neto disse...

Rosinha, obrigado pela visita e pelo comentário!!!