Arte de Weberson Santiago |
Outro dia fiquei pensando em como eu escuto música. Funciona assim:
1. Eu compro o CD físico ou compro o disco virtual no iTunes.
2. Começo a ouvir as músicas. Neste momento, a maioria delas me causa
estranhamento. Fico na dúvida se fiz um bom negócio em comprar o disco. Uma ou
outra elicia em mim uma sensação agradável.
3. Então continuo escutando apenas o disco novo em todos os trajetos de
carro e quando estou em casa, enquanto tomo banho ou estou cozinhando. Pela
repetição, o estranhamento já não existe mais e as músicas preferidas já estão
definidas. É quando eu saio por aí cantando, na rua, sem nenhuma vergonha. Não
chego a usar o celular como microfone, como fazia uma moça que parou atrás do
meu carro no semáforo, mas não ligo nem um pouco para o que os outros vão
pensar.
4. Mesmo que esteja rolando o mesmo som há algumas semanas, continuo
ouvindo o ex-CD novo. Volto a faixa quando as preferidas terminam ou pulo
aquelas que não gosto até chegar em uma música que eu gosto. De repente o disco
já não preenche os trajetos mais longos porque as músicas que não gosto começam
a me irritar. É o primeiro sinal de desgaste.
5. O disco está rodando muito quando chega uma hora em que eu não
aguento mais ouvir aquelas músicas – estou saciado – e eu arquivo o CD junto
com os outros na estante.
6. Está na hora de buscar outras trilhas sonoras para minha vida.
Sigo estes passos com todos os discos que compro. Pelo padrão de
comportamento, descobri que eu não ouço música, e sim consumo música. Escuto,
escuto e escuto até enjoar.
Às vezes vasculho a pilha de CDs e encontro algum disco que eu não me
lembrava que tinha, mas que as músicas imediatamente me remetem ao momento da
vida em que elas tocaram. Levo o CD velho para dar umas voltas no carro, mas
logo enjoo novamente.
Reencontrar um CD que marcou é igual a ver novamente um chocolate
preferido que saiu de linha de volta às prateleiras. Foi assim com o Milkbar,
que chamava Lolo. Foi assim com o Kit-Kat.
O que seriam de nossos novos gostos se não fossem as nossas antigas
paixões?
| Estou enjoado de toda a minha
discografia. Estou precisando de música nova para me inspirar. Tem alguma
sugestão?
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Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 25/07/2015, Edição Nº 1365.
4 comentários:
Muito bom professor!
Impossível não me identificar nas entrelinhas.
Se ainda não ouviu ou não conhece eu indico "Mauricio Baia", para os novos passeios no carro.
Abraços!
Obrigado pela dica, Michele!
É sempre bom ter novas trilhas pro dia a dia. Relembrar as antigas sempre traz boas lembranças... E ainda bem que tem aquelas que a gente nunca enjoa (pelo menos eu tenho algumas).
Enquanto a Roberta Sá não nos presenteia com um novo álbum de samba, procure ouvir Pélico ou Castello Branco. São os dois que mais tenho ouvindo nos últimos tempos.
Herédia, obrigado pela dica! Logo mais vou ouvi-las... Se não tivesse uma palestra amanhã de manhã, hoje iria pra gxp curtir aquela outra sua dica... Bom final de semana!
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