sábado, 8 de agosto de 2015

Minha Filha Arrumou um Namorado

Arte de Weberson Santiago



Minha menina completou quinze anos. Não é mais uma criança, não é mais a minha menina. A mãe dela me fez gastar um dinheirão na festa de quinze anos. Disse que era um sonho de nossa filha. Dizem que a festa de quinze anos marca uma passagem: de quando a menina vira mulher.
Eu não quero que ela se torne uma mulher. Eu quero que ela seja sempre a minha menina. O problema dela não ser mais minha menina começou com o fato de eu ter deixado de ser o homem mais importante da vida dela. Desde que ela conheceu aquele branquelo de aparelho, meu reinado ficou abalado. Antes, quando eu parava o carro na garagem, depois de um dia inteiro de trabalho, ela vinha me dar um abraço. Nem o dia mais infernal amarrava minha cara o suficiente para que eu não me derretesse quando ela saia de trás da porta, ou do sofá e corria para agarrar a minha perna e, com o passar do tempo, a minha cintura.
Agora, ela só pensa nele, só fala no whatsapp com ele e só suspira por ele. Eu abro a porta e me deparo com a sua ausência. Tudo bem que a Jessie que me espera abanando o rabo, mas não é a mesma coisa. Se eu vou atrás dela, abro a porta do quarto – que vive fechada – e ela está lá: no computador ou no celular falando com aquele Zé Ruela.
Eu finjo que eu não ligo, tendo transparecer indiferença, mas no fundo queria fazer uma visitinha pro menino e resolver essa história de uma vez por todas. “Que pena! Morreu engasgado com um chiclete preso no aparelho”, eu diria calma e friamente. Pelo menos acabaria com aquela cena de todo domingo: ele comendo lasanha e frango assado sentado na minha frente. Não sabe nem limpar a boca quando come e quer namorar a minha filha.
Ainda bem que a Natália sabe intermediar a relação. Me convenceu de que bancar a melhor amiga é ter acesso a intimidade. Eu não posso nem pensar nessa palavra – in-ti-mi-da-de – sem que seja tomado por uma dor fulminante no meu peito. Só de pensar na mão daquele moleque-branquelo-babão na perna da minha princesinha, eu quase tenho um infarto.
Aquela perna era só minha e era tão pequeninha que eu segurava com as minhas duas mãos – que praticamente davam as voltas nas suas coxas – e a colocava em meus ombros. E enquanto eu segurava suas pernas por segurança, os bracinhos dela davam a volta em minha cabeça. E eu lhe apresentava o mundo de um ponto de vista mais alto, onde ela, sozinha não poderia enxergar.
Foto do Arquivo Pessoal
Como seria bom se o tempo pudesse voltar, se ela pudesse encolher ao invés de crescer. Aquele cheiro de bebê, que durou até os três anos, foi um dos melhores cheiros que eu senti em toda a minha vida. E agora tem um banana pendurado no cangote dela.
Não adianta falar que eu estou exagerando, que eu sabia que mais cedo ou mais tarde isso ia acontecer. Sim, eu tive alguns medos repentinos de ter de dividir minha princesa desde que ela tinha sete anos, mas eu pensava e lhe dizia que só poderia acontecer lá pelos vinte e cinco anos de idade, e não aos quatorze.
Só quem é pai de menina entende o que eu estou passando. Cheguei ao máximo da pieguice semana passada, quando terminado o expediente, deixei todo mundo ir embora e abri um vídeo em que ela cantava pra mim, aos quatro anos, aquela música gravada pela Adriana Calcanhoto: “Avião sem asa, fogueira sem brasa, sou eu assim sem você. Futebol sem bola, Piu-piu sem Frajola, sou eu assim sem você. (...) Tô louca pra te ver chegar, tô louca pra te ter nas mãos. Deitar no teu abraço, retomar o pedaço que falta no meu coração. Eu não existo longe de você, e a solidão é o meu pior castigo. Eu conto as horas pra poder te ver, mas o relógio tá de mal comigo. Por quê? Por quê?”
E chorava um monte, feito uma criança...
Ela virando mulher e eu voltando a ser uma criança que não sabe dividir o brinquedo.

UM CAFÉ E A CONTA!
| Feliz Dia dos Pais ao pai do bezerrão branquelo. Espero que não fique ofendido pelos adjetivos que usei para seu filho. Se estivesse no seu lugar, também daria uns tapas nas costas dele por ele estar ficando com uma garota tão linda como ela.
Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 07/08/2015, Edição Nº 1367.

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