sábado, 16 de julho de 2011

Restaurante Italiano

Arte de Weberson Santiago



O restaurante italiano é meu consultório sentimental. Quando algum tipo de problema ronda meu relacionamento, parto para a trattoria. Não há assunto delicado que não possa ser devidamente conversado na degustação do antipasto – entrada típica, do primo piato, do secondo piato – prato ou pratos principais, da insalata – salada e do dolce – o necessário docinho da sobremesa.

A sequência é essa mesma. A cozinha italiana não serve a salada no começo e abomina pratos combinados com diversas receitas, tal qual o nosso tradicional arroz, feijão, bife e batata frita. Na culinária italiana não existe prato executivo. Verá um solitário no restaurante japonês, um viúvo a degustar comida árabe, uma solteirona na churrascaria rodízio, mas a cantina não foi feita para comer sozinho.

Na chegada, a demonstração de carinho do homem começa na escolha do vinho. O tilintar no brinde é muito romântico. O bojo da taça salta aos olhos, o aroma invade as narinas enquanto o nariz invade a circunferência. O encontro do vinho com a saliva é capaz de eliciar as mais sublimes sensações. Brinda-se o que quiser, busca-se um pretexto, comemora-se o pequeno detalhe ou simplesmente brada-se “salute!”.

Para uma reconciliação, sugiro a lasagna. É preciso muita disposição de ambos para entrar em acordo. Primeiro se ouve com respeito para depois falar. Algo simbolizado pelas camadas devidamente intercaladas deste prato. Minutos de silêncio fazem bem ao pensamento e evitam falas desapropriadas. É a hora de gratinar o pensamento.

Em se tratando de comemoração de aniversário de relacionamento, nada como o tagliarine ou fettuccine. O cuidado com o sentimento do outro na hora de dialogar é como o movimento de girar o garfo para ajeitar a massa com o molho de forma que caibam perfeitamente na boca. Além do mais, quem não se lembra da cena do filme “A Dama e o Vagabundo” em que compartilhar o spaghetti termina em beijo?

Quando o motivo da ida à cantina é a notícia da gestação, peça um conchiglione – concha grande – e diga que aquele formato será atingido no decorrer dos próximos meses.

Caso reserve uma surpresa, indico qualquer uma das massas recheadas como o raviole, o capeletti e o tortellini. Por mais que já tenha comido, o recheio é sempre novo. Há coisas que só experimentando para se saber que gosto tem. Sabor e saber são palavras que nasceram juntas e que não podem ser separadas para se atingir a sabedoria na vida.

Se por acaso cometer um excesso, não se preocupe. Você não está em um bistrô francês. No restaurante italiano cabe escorregar no molho, deixar saltar uma azeitona preta ou tirar as carnes do corte com osso com os próprios dentes.

Se eu não gosto que se intrometam no meu relacionamento, existe uma exceção. Sempre aceito a interferência do garçom no pedido quando vou à trattoria. No frio, a sugestão de brodo – sopa – de capeletti foi perfeita. Ainda me falta experimentar a macedonia – salada – de frutta.

Seja uma cantina com toalhas xadrezes vermelhas, frios e queijos pendurados em meio às fotos dos celebres clientes ou num ambiente mais sóbrio, prepare-se para ser interrompido pelo dono da casa. Italiano é bonachão e faz questão de abordar o cliente na mesa, ver se o serviço está a contento e investigar o paladar da comida. Quando o proprietário tem este costume, os italianos chama o estabelecimento de osteria.

Dia destes, numa das nossas cucinas preferidas, nos pegamos incomodados com a mesa ao lado. Tratava-se de um casal num primeiro encontro. Ele tentava impressionar, falando alto e gesticulando feito mafioso comemorando a vitória da gangue. Foi ao ver o pedido que não me restou dúvida sobre a cena. Ele pediu rondelli. Ela pediu cannelloni. Ele só queria enrolar. Ela, ainda no primeiro encontro, não via luz no fim do túnel.

UM CAFÉ E A CONTA!

| Se temos o direito de escolher o par perfeito para frequentar o restaurante, devemos ter toda a liberdade para eleger o prato certo para cada situação. Fica a sugestão.


Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria

Caderno Cultura, p. 3, 16/07/2011, Edição Nº 1156.


2 comentários:

Augusto Amato Junior disse...

Filho, deixou seu pai com água na boca. Há quanto tempo não me dou ao luxo de papar com a Dinda uma bela massa. Mas para consolo, o relacionamento está melhor que um velho chianti, muito boa a crônica, para não perder o costume, dê uma vasculhada no bloguinho do papi's:
www.augustoamatojunior.blogspot.com

Rosa Maria disse...

Boa!!!...Muito bom uma massa....abraços.
Augustin a vida é cheia de surpresas....e por sinal boas...basta olharmos com Amor...Abraços.
Deus te abençoe!