segunda-feira, 11 de maio de 2009

Rosa

Aos dezesseis dias de outubro de mil novecentos e vinte e dois ela nasce envolta pela placenta. Sinal de prosperidade. Torna-se a uma das preferidas dos mais de dez filhos. Pai construtor, mãe dona de casa. Descendente dos italianos chegados na década de 1890. Quando criança vivia explorando a pequena cidade de Mococa dentro dos limites daquela época. Quando criança passou pela rua e viu um tapete sobre o parapeito da janela com uma coleção de prataria sobre ele, ali dispostos enquanto a dona limpava a casa. Não hesitou. Puxou, correu e ouviu o estardalhaço.

Já adolescente conheceu um rapaz. Muitas conversas depois foi convidada por ele para ir ao cinema. Ele pagou, mas ela não gostou. Retirou o dinheiro e o deu, mas ele pegou e jogou longe. Era o começo de um amor, com direito a algum irmão contra a relação e outros tantos a favor. Em um baile de carnaval, vestida de marinara (marinheira) e ele de terno claro, se pegou com ciúme de outra garota. Não pestanejou e jogou uma taça de vinho no terno dele. Casaram-se e tiveram três filhos.

Era professora. Tinha a fama de brava para muitos. Alguns a consideravam impiedosa. A aula começava com uma chamada de verificação de material. A lista entregue com antecedência as alunas era lida e elas deveriam levantar o material. Se faltasse algo, eram retiradas da aula de Economia Doméstica, obviamente assistida apenas por meninas. Eram ensinadas habilidades básicas de cuidado e úteis para o dia a dia de uma casa.

Quando jovem, foi uma das primeiras mulheres a tirar carteira de motorista. A dificuldade com o automóvel foi superada com uma lata de manteiga, presente de seu marido ao instrutor. Embora sua vocação para a inovação fosse perceptível, sentiu o peso das pioneiras que conciliavam vida profissional e familiar. Procurou uma psicoterapeuta em Ribeirão Preto. Saia sozinha e enfrentava cem quilômetros de estrada de terra todas as semanas. Aprendeu muito, reviu posturas, descobriu mudanças.

Os filhos foram se casando e os netos nascendo. Avó presente, sempre disposta a ajudar os filhos e netos. Dois netos médicos, uma arquiteta, um psicólogo, um publicitário. Já com sessenta anos de casada e mais de oitenta de idade, seu maior medo é a morte. Medo possível apenas para aquela que soube e sabe amar a vida, ser pioneira na concretização de seus sonhos e ser parceira de quem a cerca.

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