sábado, 7 de fevereiro de 2015

Eu Falo ou Me Calo?

Arte de Weberson Santiago



Tenho uma dificuldade muito grande para corrigir as pessoas. Evito apontar o que o outro fez ou está fazendo de errado porque tenho medo de deixá-lo chateado.
É um excesso de empatia. Me coloco exageradamente no lugar do outro. Ao Imaginar uma pontinha de tristeza, de desgosto ou de aborrecimento após minha correção, desisto de falar.
Na arte da comunicação, uma linha invisível divide os direitos e deverem dos seres humanos. Não basta que eu respeite o direito do outro se ele não cumpre o seu dever. O contrário é verdadeiro. Não adianta que eu cumpra o meu dever se o outro não respeita os meus direitos.
Ainda que existam diversas maneiras de dizer a mesma coisa, ainda que a gente aprenda com os erros que por ventura venhamos a cometer, o fato é que eu não me permito experimentar. Com medo de ser agressivo no relacionamento interpessoal, acabo caindo sempre na passividade.
Mesmo que já tenha explicado uma, duas ou três vezes tenho dificuldade de exigir que a pessoa mude de atitude. Mesmo que o cargo que eu ocupe me permita ser incisivo, não falo. Mesmo que a minha história de relacionamento com a pessoa me dê o direito de ser contundente, me calo. Na hora de exercer a autoridade, eu me esquivo.
Me sinto um fracassado ao deixar passar uma oportunidade de ser assertivo, mas me acalmo imaginando que evitei ser desagradável ou que deixei de comprar uma briga. Como se eu pudesse, com isso, por fim a contrariedade no mundo e na sociedade. Como se eu pudesse com isso extinguir o descontentamento.
Prefiro sair descontente e contrariado do que correr o risco de deixar alguém assim.
Aliás, comigo mesmo a coisa muda. Sou o crítico dos críticos quando avalio a minha própria conduta. Sempre penso que uma cara de aborrecimento de alguém que convive comigo se deve ao que eu falei ou ao que eu fiz. Fico buscando relembrar o que eu disse e supondo qual frase desapontou. Recordo uma palavra que eu disse que pode ter sido mal interpretada.
Quando analiso meu próprio comportamento, acabo sendo duro demais. Me culpo sem ter culpa. Me dou bronca sem ter feito algo errado. Aponto o dedo na minha própria cara. Primeiro me recrimino e depois coleto evidências de que não tenho responsabilidade no problema do outro.
Uma vez relatava esta minha preocupação em desapontar as pessoas e minha tendência a me culpar pela insatisfação alheia quando ouvi de um amigo:
— Mas como você se acha importante! Como se você pudesse ter o poder de ser a causa de tantos sentimentos importantes nos outros!
Emudeci. Percebi que ele tinha razão. Ouvir isso me deu um grande alívio. Uma verdade que me fez perceber que era pretensão demais me responsabilizar por tantas coisas que não tenho controle. E como ele me fez perceber isso? Me dizendo o que ele pensou, na lata, sem rodeios.
Dizer o que se pensa nem sempre é destrutivo. E o silêncio pode impedir o outro de construir algo melhor.
UM CAFÉ E A CONTA!
| Você passa o dia poupando os outros e sendo cruel consigo mesmo?

Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 07/02/2015, Edição Nº 1343.

Um comentário:

Rodrigo disse...

Que texto bom, Augusto. Soou muito familiar a mim. Também me calo mais do que falo. Um amigo um dia também me disse algo parecido com o que você mencionou, o que ajudou a ficha a cair mais um pouco. Digo um pouco, pois certas mudanças requerem intervenções mais frequentes para que aconteçam numa base mais permanente, rs, então é sempre bom ser lembrado de que 'não somos tão importantes assim'. Sempre que me pego agindo dessa maneira, gosto de assistir a um vídeo, pra me situar melhor no 'tabuleiro'. O vídeo é este aqui: https://www.youtube.com/watch?v=EjpSa7umAd8. No mais, parabéns pelo blog.