segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Imaginação de Criança e Pensamento de Adulto

Em uma roda de adultos conversávamos sobre uma criança que passava muito tempo brincando com seus animais. Criava enredos, dublava as vozes dos bichos, parecia se desligar do mundo real para se entregar inteiramente ao mundo da fantasia. E fazia isso em uma frequência alta e, por isso, havia chamado à atenção de um dos marmanjos que se deparava com a cena quase todos os dias.

Esquecemos que as crianças são dependentes da segurança oferecida pelos adultos durante seu processo de desenvolvimento e que a fantasia é uma ferramenta utilizada pela criança para conseguir se comportar como um adulto no futuro. Ela experimenta o papel a ser desempenhado, ocupa este lugar na brincadeira com suas primeiras noções sem o peso da responsabilidade de realmente ocupá-lo.

Nas últimas décadas valorizamos tanto o pensamento focado, produtivo, racionalmente direcionado que deixamos de lado os pensamentos que são responsáveis pela nossa criatividade, como os devaneios, as divagações e as próprias fantasias. O estranhamento dos adultos com a criança em sua brincadeira compenetrada fora da realidade mostra que não temos dado lugar a esta importante função psicológica da imaginação, inclusive para os adultos. Muitos não o fazem pelo medo de parecerem bobos, outros porque serão importunados com novos pedidos de companhia.

Nosso estilo de vida atual não tem nos dado o tempo para viver nossos compromissos satisfatoriamente, focando a atenção e se distanciando do assunto na intensidade ideal. Como resultado, uma legião de pessoas que relatam a sensação de ser engolido pelas obrigações ou de não ter dado conta daquilo que se propôs a contento. Os momentos de devaneios podem pôr fim a algum impasse pendente há muito tempo sem aparente solução, que vem a surgir ao se tomar distância do problema.

Compensamos, então, pelo excesso ou pelo caminho que parece mais fácil. Uma reunião familiar tem que se tornar um churrasco que dura um fim de semana inteiro com bebida alcoólica sem limite. Para ter sossego ao final do dia, terceirizamos atenção que deveríamos dar aos pequenos com um jogo de videogame ou computador, simplesmente pela conveniência.

Não conseguimos organizar nossas jornadas (casa, trabalho e família) e exigimos que os filhos tenham uma rotina de estudos satisfatória. Abusamos do uso de medicamentos para outros fins que não o de tratamento e ficamos espantados quando constatamos o alto índice de uso de anabolizantes por adolescentes. Um abismo criado, dentre outros motivos, pela falta de disponibilidade em compartilhar o sentimento.





Artigo produzido para o Boletim AEM e publicado na edição nº 04/2010.

Um comentário:

Rosa Maria disse...

Oi amigo.
Mesmo na fase adulta ainda temos pensamentos de criança....vamos sempre ter né,afinal a inocência persiste na confiança do dia a dia. Bjinhos....