sábado, 4 de fevereiro de 2017

O Chato, Com Ênfase no O

Arte de Weberson Santiago




Pensa num cara chato dentro de casa. Agora pensa num cara muito chato. O segundo sou eu. Um chato com pós-graduação. Passo boa parte do tempo pegando no pé da Natália e da Anelise.

Vivo fazendo brincadeiras, que elas chamam de sem graça, mas que eu adoro fazer assim mesmo. Respondo perguntas com duplo sentido para deixá-las em dúvida e faço graça inclusive quando deveríamos falar de coisa séria.

Não perco a oportunidade de fazer uma piada em qualquer situação. De vez em quando dou um susto, outras vezes cutuco na lateral da barriga, faço cocegas nos pés ou no pescoço.

Claro que eu intercalo as brincadeiras com abraços apertados de surpresa ou com alguma gentileza, senão seria insuportável. Mas parece que eu só sossego mesmo quando escuto aquele sonoro “nossa, como você é chato!”.

Deveria soar como ofensa, deveria servir como insulto, deveria ter o efeito de uma afronta. Mas para mim, ouvir “nossa, como você é chato!” é como ouvir uma música. Uma música das preferidas.

Minha resposta padrão é: “Sim, sou chato, mas sou um chato agradável!”. A tréplica costuma ser “Não, você não é chato, você é muito chato!”. Pronto, posso parar com a encheção. Mas quem disse que eu consigo parar por muito tempo?

Sou mestre em colocar apelidos, com ou sem sentido, palavras tiradas de situações ou palavras inventadas. Seria capaz de preencher uma lista telefônica com os apelidos que coloquei na Ane.

Aliás, com a pequena, poderia definir minhas brincadeiras como um treinamento para lidar com o bullying, de maneira que ela já desenvolva estratégias de enfrentamento com minhas chatices para ser mais resistente com os colegas impiedosos.

Você já deve estar pensando como é que as duas me aguentam. Não só me aguentam como não me deixam sair para o trabalho sem lhes dar um beijo e sem lhes responder a que horas eu chego. Dizem que a casa sem mim – e sem a minha chatice – fica muito sem graça.

É que elas sabem que a minha chatice é um excesso de vontade de interagir. Elas sabem que a minha chatice é uma recusa em aceitar o isolamento familiar com cada um no seu quarto. Elas sabem que a minha chatice é a nossa casa cheia de vida.

  UM CAFÉ E A CONTA!
| Ser chato é diferente de ser desagradável.

Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, caderno Dois, 04/02/2017, Edição Nº 1445.

Um comentário:

Nó tinhas? disse...

Grande Agustinho Carrara, esse privilégio não é só seu. Forte abraço.