sábado, 3 de dezembro de 2016

Desabafo em Tempos de Crise

Arte de Weberson Santiago



Tenho olhado para os lados e me deparado com coisas desagradáveis de se ver. A machete que relata uma tragédia em destaque no jornal, logo cedo, no chão da garagem. Tento não me abater com o fato de que a humanidade não deu certo.

Dali há pouco, assisto uma cena de humilhação de uma pessoa com um funcionário na frente de um monte de clientes. Fico com raiva porque o funcionário havia me atendido bem, ainda que tenha cometido pequenas falhas. A falha é o que faz de nós humanos, penso. Abordo o humilhado e digo que gostei de seu serviço, para ver se vou embora menos incomodado. O estrago tinha sido feito e eu, feito o que estava ao meu alcance.

Transitando de carro pela cidade no fim da tarde, me deparo com motoristas agitados, apressados e impacientes. O tráfego parecia um surto coletivo. Pessoas bravas, fugindo, correndo. Como animais fugindo de uma presa, sem estar sendo de fato perseguidos por algo visível. Sentindo-se armados, fortes e poderosos com o veículo guiado sob o domínio de suas mãos. Jogando seus carros em quem bem entendem, colando o seu carro na traseira do mais lento que está a sua frente. Exilo-me na calma da direção defensiva, pensando que deveria mandar uma mensagem a mulher dizendo para se cuidar no trajeto de volta para casa.

A sensação que eu tenho é que nunca foi tão difícil não se abater pelas dificuldades. Por mais que meu olhar esteja treinado para enxergar o oposto de tudo o que eu relatei nas linhas acima, parece que as dificuldades tem se multiplicado. O que tem acontecido sem trégua.

Eu continuo contemplando o que é belo, mas o que é feio e sujo grita por atenção. Eu percebo que existe bonança mesmo em períodos de tempestade ou de seca, mas a garganta tem sentido demais as mudanças bruscas de tempo.

Sim, eu enxergo o lado bom da crise e eu acho bom que a corrupção venha a tona para quem sabe diminuir de frequência. Mas que tá difícil carregar o peso das consequências de tudo isso, tá.

Afinal, quem paga o preço somos todos nós que, nos desdobramos mais um pouco, arregaçamos a manga mais um pouco, aceitamos carregar mais um pouco de peso de trabalhos e de preocupações em nossos ombros, ao mesmo tempo que aprendemos a carregar mais vento em nossos bolsos.

A gente se dá mais e recebe menos. Por isso, vive melhor quem espera menos em troca de se doar. Vive melhor quem aguenta ficar calejado de enfrentar dificuldades para não experimentar o sabor da desistência. Vive melhor quem não se entrega e que tem fé que dias melhores virão.

  UM CAFÉ E A CONTA!
| Um mundo em crise é um lugar onde as pessoas entram em crise. Qual é a sua?
Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, caderno Dois, 03/12/2016, Edição Nº 1436.

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