sábado, 11 de junho de 2016

O Creme Para as Mãos

Arte de Weberson Santiago



Outro dia a Natália me pediu para pegar uma coisa na sua bolsa. Para o homem, ter de encontrar um objeto na bolsa da mulher é uma aventura. Quase uma viagem para as savanas africanas.
Já imagino o locutor de documentários narrando os obstáculos e armadilhas do percurso até encontrar o objeto solicitado. Na verdade, eu nunca encontro.
Depois de colocar para fora metade das coisas que ela carrega, vou ficando irritado com o remover os objetos para o lado e eles caindo novamente por cima de maneira que eu me sinto procurando o fundo de uma piscina de bolinhas.
Para mim, esta é uma prova da superioridade feminina sobre nós homens. Não tenho estrutura emocional para manejar uma bolsa repleta de objetos diante da necessidade de um apetrecho qualquer. E não consigo entender como as mulheres conseguem essa proeza no seu dia a dia, em meio a tantas demandas.
Naquele dia, um dos conteúdos da bolsa que eu havia retirado me chamou a atenção. Tratava-se de uma bisnaga de creme para as mãos, já pela metade. Ao percebê-la, lembrei-me de que a Natália guarda um creme desses em diversos lugares: na gaveta do criado mudo, no seu armário no trabalho e na bolsa.
Eu já estava pronto para me dirigir a ela, dizer que não achei o que ela me pediu e questionar a mania do creme, mas não questionei, só avisei que não havia achado.
Toda vez que eu não acho uma coisa na sua bolsa, ela para o que está fazendo e me prova que está lá, em algum canto. Não questionei o motivo de tantos cremes para as mãos, espalhados pelos seus caminhos, porque pensei que o maior beneficiado por esta mania sou eu.
Quando estou preocupado e franzo a testa, ela escorrega o dedo macio bem no meio da fronte para me desenrugar a testa e eu sinto o cheiro do creme Nívea quando a mão passa perto do meu nariz.
Quando ela me olha com os olhos brilhando e resolve fazer as mãos de cadeira para o meu queixo, sinto o perfume do creme de castanhas durante o carinho.
Quando ela repousa sua palma sobre a minha mão, que está dando sopa por perto, e eu retribuo com um beijo na sua mão, sinto o cheiro de erva-doce.
Ao lembrar disso, resolvi que o presente do dia dos namorados será uma caixa cheia de creme para as mãos, de diferentes marcas e perfumes. Mulher quando ama usa luvas invisíveis macias de cheiro.
UM CAFÉ E A CONTA!
| Mais difícil do que encontrar algo na bolsa dela é conseguir esconder um presente dela até que chegue o dia de dar.

Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 11/06/2016, Edição Nº 1411.

Um comentário:

Elenir Freitas disse...

Uma crônica cheia de sinestesias, bem estilo Augusto. As mulheres têm segredos que até o segredo desconhece. Depois, amigo Augusto, se você desvendar tudo, perderá o sabor do eterno encanto, perderá a magia da descoberta.Beijos a vocês.