sábado, 9 de janeiro de 2016

Férias de Verdade

Arte de Weberson Santiago



Depois de longos meses de trabalho, recebi o aviso de férias. Nele aparecia a data de quando eu descansaria. O dia em que as obrigações dariam trégua, quando estaria livre das amarras dos compromissos.
O que eu fiz? Comecei a imaginar o que eu faria a partir desta data. Sem pestanejar, comecei a fazer uma lista de afazeres para as minhas férias.
Preciso consertar aquelas coisas pequenas que me incomodaram durante o ano, mas que não tive tempo de arrumar. Inclui:
Prender com aquele ferrinho a maçaneta da porta para que ela não saia mais na minha mão;
Parafusar o porta toalhas do lavabo para que ele não caia de vez;
Dependurar o quadro que ganhei de um amigo;
Retirar o globo dos lustres que a Natália me cobra há meses para que a faxineira possa remover o cemitério de insetos;
— Substituir algumas telhas da lavanderia por telhas de vidro, que foram compradas há três meses, mas ficaram amontoadas no quartinho do fundo;
— Trocar as plantas de vaso para aliviar as raízes do sufoco e podar a árvore da calçada para que ela não continue crescendo desordenadamente;
Quando a lista de afazeres já havia atingido o comprimento de um pergaminho, notei que estava substituindo minha rotina de trabalho por uma rotina de afazeres em casa. Percebi que estava evitando entrar em contato com o tempo ocioso e que não estava me permitindo fazer coisas que gosto. Queria resolver pendências, mas boa parte do que faço na rotina de trabalho é resolver pendências. Passar as férias fazendo o que se faz quando não se está de férias, não é férias de verdade. Férias de verdade devem incluir coisas que dão prazer e que não temos disponibilidade de fazer enquanto estamos trabalhando.
Como somos humanos e não temos um botão de liga e desliga, sair do ritmo alucinado da repetição do cotidiano e ocupar a ausência total de tarefas das férias é um processo que exige tempo. Alguns dias são necessários para se adaptar. Ir desacelerando, mudando de ritmo. Por isso é que a primeira e a última semana das férias, ou os primeiros e últimos dias, são os mais difíceis. São os dias de transição.
Quando saímos de férias, nos deparamos com o vazio da rotina. Me pergunto: quem sou eu sem todos aqueles compromissos? Quando as férias estão se aproximando do fim, nos deparamos com a ansiedade do retorno. A questão é: vai voltar tudo outra vez! Será que eu dou conta?
O meio das férias é a melhor parte, é quando conseguimos aproveitar mais. Por isso, as férias não podem ser curtas demais, para dar tempo de aproveitar.
As férias são um distanciamento da rotina que serve para se desligar e para descansar. Só voltaremos verdadeiramente renovados para a rotina se nos permitirmos desligar e descansar.
Sua vida só anda se você parar. Pelo menos uma vez ao ano.
UM CAFÉ E A CONTA!
| As pessoas olham o descanso e as férias com maus olhos. Ignoram o fato de que a qualidade do trabalho cai se não há trégua.
Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 09/01/2016, Edição Nº 1389.

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