Arte de Weberson Santiago |
Às vezes percebo em mim um medo de te perder. Este
sentimento começa pequeno, como uma pedrinha que vai parar dentro do sapato.
Então, ele persiste como quando a pedrinha fica mudando de lugar dentro do
sapato, cada hora fazendo doer uma parte do pé.
A persistência do medo me faz imaginar possíveis motivos que você teria
para me deixar. Rastreio possibilidades de motivos ao nosso redor. Se não
encontro nenhum palpável, invento um. O medo faz de mim uma caçadora de possíveis
motivos. A correria não me permite parar para cuidar deste incômodo. Talvez por
isso é que às vezes o medo venha tão forte. Em meio aos meus afazeres sou
invadida por um temor enorme de que você não volte mais para mim.
O medo parece um fantasma a me perseguir. O encontro nos lugares menos
prováveis, como logo depois de um momento feliz que passamos. Acho que ele é um
fantasma do passado. Uma consequência das traições que eu assisti e das
traições que eu sofri. Como se nossa história não pudesse ser diferente.
Nossa história já é diferente. Você me faz tão bem e eu te amo tanto.
Parece até que aquela música do Chico foi escrita pelo que eu sinto: “Eu sou
sua menina, viu? E ele é o meu rapaz. Meu corpo é testemunha do bem que ele me
faz”. Talvez, se você fosse um traste, eu não tivesse tanto medo. Ou tivesse.
Mas é que apesar de ser chato às vezes, você é romântico, você me cuida, você
me protege.
Quando eu confesso meu medo para você, você me recita aquela composição
do João Cavalcanti, integrante de uma das suas
bandas preferidas: “Sei que entre um cais e outro há incontáveis corações. Não
navego neste mar de ilusões. Não aprendi a velejar, sem um norte a alcançar, sem
um lar em terra firme”.
E mesmo você tentando me convencer de que você parte todo dia para
regressar, meu medo me faz lembrar o final desta mesma canção: “Eu que cheguei
a imaginar, no momento em que pisei, no teu chão tão bem cuidado. Que tinha
achado meu lugar, que ali seria o rei e que o mar era passado. Mas a calmaria
não convém. Que grande ironia é saber. O coração que é do mar, já nasceu pra
navegar e não para em terra firme.”
Tenho medo que você descubra que seu coração é do mar, e não da terra.
Não adianta vir com argumentos. Já repeti uma série de racionalidades para mim
mesma e não adiantou de nada. Medos não seguem a razão, medos seguem o instinto
e a intuição.
Queria ter a mesma segurança que você parece ter. Se para ter você eu
preciso conviver com o medo de te perder, eu o aceito.
O medo de perder é um medo de amar. Não um medo de vir a amar, mas um
medo de quem já ama. E muito.
| Aquele
que nunca teve medo de perder, nunca amou de verdade.
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Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 14/11/2015, Edição Nº 1381.
Um comentário:
Estou aqui de boca aberta pensando : Como não fui eu que escrevi essa crônica, se ela traduz meus sentimentos.
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