sábado, 10 de janeiro de 2015

Eternamente Namorados

Arte de Weberson Santiago


Estava no primeiro ano da faculdade, aos 17 anos, quando peguei uma carona partindo de Mococa rumo a São Paulo com o meu tio-avô Roberto Braga e sua esposa, a tia Irai.
Depois de muita conversa, ative-me a leitura de textos passados pelos professores da faculdade no banco de trás. A tia Irai pegou no sono. Numa de minhas pausas para pensar no que o texto dizia, presenciei uma cena que me marcou.
Tio Roberto tocou a perna da tia Irai e afagou-lhe a coxa enquanto ela dormia. Era como se suas mãos quisessem conversar, mas como ela dormia, o tato funcionava como uma resposta. A cena se repetiu mais adiante na estrada, seguida de um olhar generoso com um sorriso no rosto dele para ela dormindo. Percebi que ele ficava feliz em encontra-la ao lado, ainda que ela estivesse cochilando.
O carinho pode ser comum entre jovens apaixonados, mas parece faltar aos casais com mais tempo de união. Fui testemunha ocular do que eu julgo que está em falta. Eles já haviam passado dos 35 anos de casados, mas conservavam o carinho de quando eram apenas namorados.
Quando vi aquela cena, tive uma única certeza: “É isso que eu quero para minha vida”, pensei. Naquele momento eu era inexperiente, nunca havia namorado. Mal sabia beijar direito, mas já definia o que queria como maturidade no meu casamento.
Qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade reverencia um casal de mãos dadas ou demonstrando carinho um para com o outro. Eu admiro a preservação do amor a despeito do tamanho da história. Admiro a persistência da gentileza, a insistência do afeto.
Numa das psicoterapias que fiz, antes de mim era atendido um casal de velhos, certamente com mais de oitenta anos cada um. Eu achava um barato os dois investirem tempo e dinheiro para pensar na relação, para cuidar dos sentimentos.
Tio Roberto e tia Irai vão descobrir agora, lendo esta crônica, que me serviram de inspiração. Ela já estava escrita quando vi seus filhos comemorando na rede social os cinquenta anos de casamento durante esta semana, quando minha crônica será publicada. Nada mais oportuno. Aquele gesto simples despertou minha admiração. E este amor preservado pelos dois sem dúvida fez e faz a diferença para a vida dos filhos e dos netos. É uma família bonita, que esbanja amor.
Que eu possa cumprir a promessa, que em primeiro lugar fiz a mim mesmo e mais adiante a Natália, de ser sempre namorado dentro do meu casamento, até o fim de nossas vidas.

UM CAFÉ E A CONTA!
| O que se repete todos os dias é o que constrói o futuro.

Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois,10/01/2015, Edição Nº 1339.

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