Arte de Weberson Santiago |
Se você é homem, um dia será vítima da polêmica da volta do salão de
cabeleireiro. Se as mulheres têm o hábito da mudança do cabelo, mais cedo ou
mais tarde o homem cai na discussão criada em cima dos comentários sobre o
resultado. Nenhum barbudo, nem mesmo o mais sensível, será brilhante na
avaliação em todas as idas dela ao cabeleireiro.
Natália sempre me surpreendeu. Trabalhava o dia todo, estudava à noite e
estava sempre com a aparência impecável, como se tivesse passado o dia em um
SPA. Tinha a sensação de ser um homem de sorte, já que cada vez que buzinava na
porta da casa dela, ela saía na direção do meu carro como quem partia para a
passarela, sendo que o desfile terminava em meus braços.
Passado o começo do namoro, passei a compartilhar os custos envolvidos
em manter a aparência. Levava o tempo e o dinheiro dela, mas começou a tomar o
meu tempo quando fui trocado pelo fim de tarde no cabeleireiro – leia-se 5
horas – ou quando passei a esperar um bom tempo entre a buzinada e a saída. Sem
muito esforço, enchia-a de elogios e depois reclamava um pouco da espera. Ela
só ouvia a primeira parte.
Não é o elogio ouvido, é a necessidade de saber que ela mudou para
alguém além do espelho. Não vale o cabeleireiro. Não vale a manicure. Muito
menos aquelas que também optaram pela mudança no salão. Tem que ser dito pelo
namorado, marido, ficante ou amante. Na ausência destes, pode ser reconhecida
pelo homem que passa na rua. Ela ignora a olhada e a cantada barata, mas sente
que ganhou o dia.
Se é o marido ou o namorado, trata-se da prova de fogo para a
sobrevivência do relacionamento. Dizem que é difícil dizer o sim no altar, mas
o vestibular para medicina do casamento é a reação do homem quando ela chega do
cabeleireiro. A mulher não aceita resposta incompleta, já que no vestibular não
existe meio certo. E elas comentam, umas com as outras, o que registraram no
gabarito de nossas respostas. Definem em conjunto os candidatos aprovados e os
reprovados.
Na última vez que ela voltou do salão, foi logo abrindo o caderno da
prova:
— E aí, o que achou do corte?
— Ficou bom, mas você ficou mais loira.
— Eu sabia que você não ia gostar.
— Mas eu gostei da cor, só acho que essa franja reta faz parecer que
você usa uma peruca.
Ela emudeceu, fez cara feia, se emburrou e depois pareceu ter esquecido.
Só pareceu, já que voltou ao assunto no dia seguinte:
— Vamos sair hoje?
— Sim, vamos!
— Vou me arrumar, pena que você não gostou do meu cabelo...
— Mas eu disse que não gostei?
— Não, só disse que está parecendo uma peruca!
— Se você quer saber, a maioria das mulheres gostaria de ter um cabelo
como o seu.
— Mas eu fiz pra você...
— Achei que tinha feito porque gostava. Eu gosto do seu cabelo natural,
loiro nas pontas e ondulado. Mas se você gosta dele liso e mais claro, sabe que
eu te acho linda de qualquer jeito – disse enquanto já me via vencido a aprovar
seja qual for a mudança da próxima vez.
Ela não se deu por vencida. Saiu do trabalho no dia seguinte com uma
trança diferente. E quando eu disse que gostei, confessou que gastou metade do
horário de almoço para a amiga fazer. Mudou a franja de lado, colocou a franja
para trás e bagunçou tudo porque sabe que com menos que isso já chama a minha
atenção. Eu consegui meu sossego quando ela conseguiu o que queria: ser vista.
Quinze dias depois estávamos em um casamento de uma grande amiga dela.
Assistimos a uma longa cerimônia até chegar à festa. Quando fomos cumprimentar
o casal, a noiva vira e diz para o noivo na nossa frente:
— Se um dia você disser que eu uso peruca, nosso casamento está acabado.
Com essa polêmica da franja, eu é que quase fiquei careca.
| Experimente não notar mudança no visual ou esqueça uma data
importante e conheça a fúria da sua mulher.
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Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, primeiro caderno, p. 2, 08/03/2014, Edição Nº 1292.
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