Arte de Weberson Santiago |
Meu
amigo Paulo reclamou de ter pegado um resfriado e, de brinde, uma dor de
garganta. Disse que ficar doente atrapalha o cumprimento das obrigações do
dia-a-dia, mas que o pior foi que adoeceu justamente quando chegou o fim de semana
da sua viagem.
Adoecer,
na maioria dos casos, é o resultado de ser exigido ao extremo, sem ter um tempo
de recuperação entre as exigências.
Como um
carro depois de percorrer um longo e sinuoso trajeto, com direito e subidas e
descidas até o seu destino. Quando é que o carro dá sinais de desgaste?
Quando
ele estaciona na garagem. É quando ele para que a ventoinha começa a girar para
remediar o superaquecimento.
Não é
durante o percurso por entre as adversidades que aparece a doença. Ainda que
tenhamos que nos manter em primeira e segunda marcha por um bom tempo, ignoramos
os primeiros sinais de desgaste para dar conta da jornada até o fim.
Assim
aconteceu com o Paulo, que teve de lidar com muitas situações estressantes, e a
oportunidade de descanso e lazer pareciam não chegar nunca. Como as contingências
da sua vida não o permitiram parar, só pôde se contentar com a contagem
regressiva para a viagem.
Quando
as coisas se acalmaram e a viagem chegou, o organismo do Paulo arregou, superaqueceu.
E seres-humanos não vêm com ventoinha de série.
Ninguém
gosta de ficar doente, salvo alguém que apela para a barganha ou quer tirar
alguma vantagem. A doença é um impedimento, um lembrete para mostrar que temos
limites. Por outro lado, a doença é também uma proteção, um sinal que chegou a
hora de parar e se cuidar.
Não é
todo mundo que consegue identificar os motivos do adoecimento. É preciso de um
bocado de sensibilidade, tempo e disposição para isso. A maioria prefere
aliviar os sintomas com a medicação a entender os mecanismos e as causas do seu
aparecimento.
Uma
dor-de-cabeça pode ser dor-de-pensar. Pode ter a função de esquiva de alguns
problemas nos dias em que estamos sem disposição para encará-los de frente. A
cabeça dói.
Uma
dor-de-barriga pode ser resultado de um forte medo do que esta por vir. Uma
diarreia pode ser uma dificuldade em aceitar que não se tem controle do que
acontece ao redor.
Uma
dor-de-estômago pode ser dificuldade de digerir os acontecimentos. Repare como
é difícil comer quando estamos brigados com quem estamos acostumados a tomar as
refeições. É preciso estar relaxado para digerir. Caso contrário, a comida não
desce, ou desce causando incômodo.
Uma dor
nas costas pode ser falta de jogo de cintura. Travar as costas pode ser falta
de flexibilidade. Sempre acompanhados por uma tensão muscular anterior ignorada.
Na hora de um esforço de alongamento ou agachamento além dos limites do corpo,
a lesão acontece.
A
insônia pode ser uma compensação da inércia. Uma recusa do corpo em relaxar e
descansar, resultado de ter se comportado ao contrário do contexto. Explico. Na
hora de agir, ficou paralisado. De tanto esperar que as coisas se resolvessem
por si só e, sabendo da própria responsabilidade, obriga-se a remoer os
problemas na hora de repousar.
A
doença, quando está nos outros, é o que de mais poético existe. A doença, da
parte do doente, não é dele e não deveria estar nele.
| Ignore a dor e espere que ela irá gritar.
|
Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, Caderno Dois, p.4, 08/05/2013, Edição Nº 1251.
Um comentário:
Muito bacana.
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