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Arte de Weberson Santiago |
Estávamos em casa recebendo um casal de amigos para o jantar. Anelise se
arrumava para ir ao aniversário de uma de suas duas melhores amigas. A toda
hora ela nos perguntava que horas eram, pois não queria chegar atrasada na
festa e perder algum momento importante.
Quando deu a hora, saímos o meu amigo e eu para leva-la até a chácara
onde aconteceria o aniversário. Seguimos o mapa que veio com o convite,
entramos na estrada de terra e chegamos até o local. Eu desci do carro e
perguntei ao pai que esperava na porta:
— Aqui é o aniversário da Júlia?
Sem deixar o pai da aniversariante responder, a Anelise disse:
— Que, Júlia, pai? É Carol! – esbravejou enquanto levava a mão até o
rosto como quem passava pelo maior vexame da sua vida, aos sete anos.
O pai da aniversariante, segurando uma long neck de cerveja enquanto
recepcionava os convidados da filha, deu risada da situação.
Eu tratei de entrar no carro e dar no pé, fiquei com vergonha do furo e
com medo de ter estragado a sua festa. Eu que me achava o máximo por saber o
nome de seus programas preferidos, cantores e das suas duas melhores amigas, acabei
por inverter o nome delas no dia do aniversário.
Quando nós voltamos ao nosso jantar em casa, o relato do furo foi motivo
de risadas. Mas a minha vergonha de mim mesmo só passou quando ela voltou feliz
e contente da festa.
Então eu fiquei pensando se é possível educar um filho sem lhe fazer
ficar envergonhado com alguma atitude de seus pais. Foi quando me lembrei de
outra situação. Quando vou leva-la à escola, costumo colocar uma música que
gosto e ir cantando no caminho. Ela costuma me acompanhar no canto, mas
conforme vai chegando perto da escola e eu estou empolgado com o refrão, ela me
pede para parar de cantar.
— Para pai, senão alguém vai pensar que você é louco e eu vou morrer de
vergonha!
— Tá bom...
Ainda não cheguei naquela fase em que o filho pede para deixar numa
esquina antes ou a dois quarteirões da escola.
Eu não me importo que ela tenha vergonha da minha aparência ou do nosso
carro, porque ela está comparando o que ela tem com que os outros tem. Está
construindo sua identidade e experimentando quem é ou gostaria de ser. Isto
envolve admirar alguns modelos e rejeitar outros modelos. Quem nunca pensou que
seus problemas estariam resolvidos se tivesse nascido em outra família?
O que eu não suportaria é que ela tivesse vergonha de mim pela minha
falta de caráter ou pela minha desonestidade. Quando a isso, dou o exemplo. Do
resto, sem querer vou lhe dando pequenos bons motivos para se envergonhar.
| O
que te envergonha na infância um dia pode ser motivo de orgulho.
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