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Arte de Weberson Santiago |
A Natália e eu resolvemos melhorar os nossos hábitos alimentares para
perder alguns quilos que ganhamos nos últimos anos devido a uma rotina
estressante. Com uma mudança de hábitos na hora das compras, orientação
nutricional individualizada, atividade física, muita organização e
comprometimento conseguimos emagrecer sem perder o prazer em comer. Em três
meses, ela emagreceu sete quilos e eu cinco.
Então, chegou o dia em que eu fui dar um curso em Ribeirão Preto e a
Natália foi me acompanhar. Durante a nossa permanência em Ribeirão, comecei a
perceber uma série de olhares para ela.
No almoço do primeiro dia, enquanto entramos no restaurante, um homem de
meia idade ficou olhando para ela. Eu fiquei muito irritado. Dei uma encarada
no cara, arregalando os olhos e levantando a sobrancelha como quem diz “não
está vendo que ela tá acompanhada?” ou “por que não olha pra minha cara ao
invés de ficar olhando pra ela?”.
Se comportamentos agressivos fossem parte de meu repertório
comportamental já teria soltado um “tá olhando o quê?” e teria partido pra cima,
caso ele não enfiasse o rabo no meio das pernas. Como não é assim que eu
costumo agir, percebi que fiquei cercando ela tentando impedir novos olhares.
Esse incômodo se repetiu no shopping, depois do curso que eu dei, com outro
olhar descarado de um cara que a secou dos pés a cabeça.
Quando eu vejo um homem olhando para a minha mulher, eu trato de
demarcar meu território como um cachorro que faz xixi no poste. O cara olha, eu
trato de passar o braço pelo ombro dela, dando o recado: “tem dono, olha
outra!”. Se o cara fica olhando ela vindo, me ponho atrás dela só pra tampar a
sua bunda e não deixar o cara ver depois que a gente passar.
É por gerar este tipo de situação que eu já li em materiais de
psicologia que o cônjuge passa a boicotar o emagrecimento de seu parceiro, oferecendo
comida, pois ele ou ela prefere evitar o desconforto do ciúme do que aprender a
lidar com este sentimento. O boicote é menos custoso do que o esforço para
manter o interesse do parceiro, dá menos trabalho do que exercitar a sedução. O
ruim é que o fracasso de engordar novamente, intenção das tentativas de
boicote, custa a autoestima do parceiro.
Quando expus meu incômodo pra Natália, percebi que ela nem tinha notado
os caras lhe olhando. Percebi que o incômodo era meu e com o comportamento do
cara. A única responsabilidade dela era o fato de ser atraente, já que não foi
um comportamento inadequado dela o que despertou o interesse do cara. Percebi,
também, que ela gostou de saber que eu me preocupo em demonstrar que ela é
minha mulher e que eu busco preservar nossa relação.
Mas, diferentemente de mim, o ciúme da Natália é mais contido e
elegante. Ela prefere ignorar o interesse alheio por mim. Não porque não se importa
em me perder, mas porque no fundo não se sente ameaçada.
Já o meu ciúme é do tipo guarda-costas. Fico em volta, cercando e protegendo
ela dos olhares alheios. Ela não se incomoda com isso e eu não pretendo mudar meu
comportamento. O que me incomoda não é o fato dela ser bonita e atraente. Fico
incomodado com a petulância e a falta de vergonha na cara de quem fica olhando
pra ela na cara dura e na minha frente.
| Tenho
ciúme porque valorizo.
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Publicado no Jornal Democrata, coluna Crônicas de Padaria, capa do caderno Dois, 22/08/2015, Edição Nº 1369.
