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Arte de Weberson Santiago |
Em seu último trabalho musical (chamado Disco, lançado em 2013), Arnaldo
Antunes gravou uma musica chamada Dizem, cujo refrão diz: “Quem me dera não
sentir mais medo. Quem me dera não me preocupar. Quem me dera não sentir mais
medo algum.”
A primeira vez que ouvi a música, essas três frases me fizeram pensar.
Ficaram ecoando em meus pensamentos.
Quantas vezes nos enchemos de esperança de nos livrarmos de nossos medos
e preocupações – “quem me dera não sentir mais medo algum”. Queríamos que eles
desaparecessem, pois assim pensamos que a vida seria menos sofrida. No fundo, desejamos
que uma mágica nos livre dos medos. Apelamos sem pestanejar a um remédio que prometa
acabar com eles. Gostaríamos que alguém nos desse a capacidade de não temer ou de
não carregar preocupações, como se alguém – o padre, o pastor, o médico ou o
terapeuta – pudesse fazer isso por nós. Eles podem, se preparados e dispostos,
acolher nossos medos e amenizar nossas preocupações.
Outras vezes, colocamos naquilo que nos falta a expectativa de eliminar
essas emoções desagradáveis. Quando eu tiver um carro daquele, minha felicidade
será tão grande que não terá espaço para os medos. Quando eu conseguir perder
esses dez quilos, minhas preocupações irão se acabar. É quando queremos nos
livrar dos medos e das preocupações que construímos algumas ilusões.
O medo é um sentimento, já a preocupação é um pensamento. Pensamentos e
sentimentos vão e vem, variam em intensidade, mas nunca acabam. A vida nos
presenteou com os medos e as preocupações. São parte do pacote. São tão seus
quanto seus órgãos. Te acompanharão na sua jornada em todas as suas escolhas.
Faz parte da vida tolerar a existência dos medos e das preocupações, faz
parte da existência encará-los. Faz parte do amadurecimento aprender novas
formas de lidar com eles.
Uma metáfora para explicar como funcionam os pensamentos e sentimentos: considere
que nossa interação com o mundo é como um rádio. Somos o aparelho tentando
emitir um som em perfeito equilíbrio enquanto nos relacionamos. Vamos agindo
tentando manter a sintonia, só que às vezes acontecem alguns chiados.
Os pensamentos e os sentimentos são os chiados. Eles são as
interferências que afetam nossa sintonia com o mundo, que podem ser de
intensidade mínima ou muito intensa, podem ser interferências curtas ou
duradouras.
Assim como um rádio reproduz músicas agradáveis ou desagradáveis, nossos
pensamentos e sentimentos podem ser prazerosos ou incômodos. Medos e
preocupações são incômodos.
É preciso tomar cuidado para não amplificar os sentimentos de medo com
os pensamentos negativos, causando o barulho insuportável de uma microfonia. Para
manter a sintonia é preciso aceitar o chiado sem amplificar o seu ruído.
| Medos e preocupações podem ser aliados se usados como sinais para se
proteger, desde que você não deixe que eles tomem conta.
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