Foto: arquivo pessoal.
Quando cursava Psicologia, tive uma matéria de Orientação Vocacional que
funcionava como uma supervisão paralela aos atendimentos de adolescentes
vestibulandos. O nosso supervisor, Prof. José Maurício aplicava as técnicas em
nós durante a supervisão e, em seguida, nós aplicávamos nos estudantes.
Numa das supervisões, ele pediu que fizéssemos um exercício de imaginação
do nosso futuro profissional em uma cena, e depois descrevêssemos para o grupo.
A imagem que veio na minha cabeça foi de uma mesa grande de mármore e eu
sentado de camisa social, mas de bermuda embaixo dela.
Naquela época eu era obeso e sentia muito calor. Diz a lenda que o Cid
Moreira apresentava, ao vivo, o Jornal Nacional de terno na parte de cima e
bermuda por baixo da bancada.
Eu queria fazer igual. Pois bem, graças ao Corona Vírus este sonho se
concretizou! Com a pandemia, só podendo realizar sessões virtuais por meio de chamada
de vídeo, posso atender de bermuda e Havaianas, e assim estou fazendo. Mas não
foi só isso que ele me deu.
Natália e eu trabalhamos revezando de consultórios em duas cidades. Por
isso, nunca trabalhamos ao mesmo tempo no mesmo lugar. Não conseguimos almoçar
juntos durante a semana, nem tomar um cafezinho no meio do expediente. Agora,
graças ao Corona Vírus, atendemos virtualmente em cômodos vizinhos de nossa
casa. Quem tem um intervalo prepara um café, faz um bolo. Neste período, podemos
almoçar juntos, em família, todos os dias. Benefícios graças ao Covid-19.
O Corona Vírus também me permitiu resgatar alguns hobbies que não estavam
encontrando espaço na minha rotina. Estou pintando um par de quadros enorme
para um casal de amigos há mais de um ano e meio. Não havia tempo e, quando
havia, faltava paciência e disposição. Foi retomada a pintura, e espero termina-la
até o fim da quarentena.
Passei o ano de 2019 inteiro sem publicar uma crônica por conta do
gerenciamento de uma obra em casa, o que me tomou todo o tempo livre que me
restava. A obra terminou no fim do ano passado, mas só agora com a pausa
obrigatória da quarentena que eu tive a possibilidade de sentar e escrever
essas palavras que você lê.
Perdemos e perderemos algumas coisas – que eu espero que por termos agido
antecipadamente não percamos muito – com essa pandemia, mas é preciso saber
reconhecer também os seus ganhos. A tão importante gratidão, que de tanto ter
seu uso banalizado, vem correndo o risco de perder a essência do seu
significado. A verdadeira gratidão consiste em ser grato inclusive pelas coisas
que nós não queríamos que tivessem acontecido, mas que nos trouxeram
aprendizados por terem acontecido.
Obrigado, Corona – olha a intimidade! – por ter me permitido experimentar
uma série de coisas que eu desejei e que se não fosse você eu não experimentaria.
Obrigado por ter me exigido flexibilidade de comportamento, por ter me feito
experimentar a empatia, por ter feito valorizar a minha rotina e a minha
liberdade.
| É importante se proteger para o futuro, mas não podemos esquecer
de viver o momento presente. E neste exato momento, eu não estou em sofrimento.
Obrigado.
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