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Arte de Weberson Santiago |
Outro dia fiquei intrigado com aquela quantidade de insetos que morrem
no vidro do nosso carro quando pegamos a estrada durante o entardecer.
Eles se esborracham com tanta força que não se vê nem asa, nem pata pra
contar história. E ainda dão um trabalho pra tirar seus restos em forma de
gosma do vidro e do farol do carro.
Pesquisando, descobri que os insetos, habitantes da terra muito mais
antigos que nós humanos, usavam a luz da lua para se orientar no caminho
durante a busca de alimento. Assim, conseguiam se alimentar e pegar o caminho
de volta para onde saíram.
Por isso que hoje, qualquer luz artificial colocada em seu caminho lhe
desorienta e, geralmente, lhe atrai. Este comportamento geneticamente
selecionado é mais forte do que a sua própria capacidade de lutar pela sobrevivência.
A busca desenfreada pela luz pode leva-lo à morte. É o caso tanto dos que vão
ao encontro de um veículo em movimento, quanto daquele inseto que invadiu sua
sala e morreu de tanto dar cabeçadas na luz que fica entre você e a sua
televisão.
Logo após pensar na obsessão dos insetos pela luz, cheguei à conclusão
que nós humanos não somos muito diferentes disso.
Pense em algum tipo de comportamento persistente que tem consequências
ruins a longo prazo para entender que a nossa insistência pode ser perigosa. O
pior é que muitas vezes não temos consciência disso.
É o caso de quem consome álcool ou drogas. As drogas liberadas ou proibidas
são como amortecedores. Diminuem o impacto das experiências cotidianas. Seu uso
é um comportamento de esquiva de sentimentos negativos resultantes da nossa
relação com o mundo. E como funciona temporariamente – a curto prazo – seu uso
tende a aumentar de frequência e intensidade.
É uma questão de tempo para que as cabeçadas comecem a acontecer
repetidamente – a longo prazo – na forma de excesso de consumo, comportamentos
de risco (beber ou se drogar e dirigir na estrada, por exemplo) e a própria
dependência química. Um caminho sem volta cujas cabeçadas na lâmpada são as
recaídas. Há ainda o risco de numa dessas, acabar como o inseto no para-brisa,
perdendo a vida.
Outro exemplo é aquele que fica viciado no jogo da sedução. Busca
desenfreadamente confirmar o flerte, mas desiste da outra pessoa quando percebe
que ela está verdadeiramente envolvida. Quer apenas o desafio da conquista e
não o compromisso da relação.
Comportamento selecionado culturalmente entre os homens, hoje é parte do
repertório das pegadoras. Trata-se de um vício em sentir aquelas reações
fisiológicas típicas da paquera, em querer viver a maior intensidade possível
das emoções.
Um escravo das sensações de curto prazo tem dificuldade de construir
relacionamentos duradouros a longo prazo. Quando para pra pensar, já é um
tiozão no meio da balada. Quando percebe o padrão de relacionamento já é
chamada de tia pelos filhos das amigas. Há quem prefira continuar a dar
cabeçadas quando o assunto é relacionamento afetivo e sexual.
Viver em buscar prazeres imediatos é o que nós temos em comum com os
outros animais. A capacidade de perceber onde esses prazeres nos levam é o que
nos diferencia das demais espécies.
O problema não é dar uma cabeçada na vida, é ter cabeça de inseto e ignorar
todas as consequências. O problema é quando a cabeçada não lhe faz mudar de
direção.
| Você é escravo de qual repetição? Que tipo de comportamento você
não consegue mudar?
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